Em 2006, com 28 anos, eu já bebia, quase diariamente, desde os 18. Como você pode imaginar, depois de 10 anos de consumo, a palavra alcoolismo já não me assustava mais. Embora eu soubesse que o álcool era responsável por boa parte dos meus problemas, ele também esteve presente nas minhas maiores alegrias, e isso era um grande paradoxo na minha mente. Não entendia as profundidades da dependência de álcool.
No entanto, um ano antes, aos 27, minha vida mudou drasticamente quando experimentei uma nova droga: o crack. Ao adicioná-lo ao meu vasto repertório de substâncias, tudo mudou para pior. Além de eu já não conseguir beber socialmente como antes, também não conseguia parar de usar outras drogas. Era quase automático: bastava tomar uma cerveja para pensar no crack. Essa situação me envergonhava a ponto de esconder até dos amigos mais próximos.
Nos meus pensamentos mais íntimos e infantis, eu tinha o sonho de viver uma vida longa, cheia de aventuras com a minha família. Se possível, inclusive, com toda a elegância de um bom boêmio que sabe encontrar a felicidade nas coisas simples. Eu não pensava em parar de beber porque não imaginava que o alcoolismo, somado à dependência química, era tão devastador.
Acredito que conheci o inferno em vida por conta da dependência em álcool e drogas. Abandonei minha ex-mulher e sua filha, deixei o emprego em uma multinacional, me afastei de amigos e, por fim, nem minha mãe me reconheceu mais. Minha vida perdeu o sentido. Até que fui parar no hospital e fiquei internado por quase um mês. Passei por um processo difícil de desintoxicação, sofri muito com a abstinência, fiquei dias sem dormir e com vontade de fugir para voltar ao uso.
Certo dia, no hospital, recebi a visita de alguns senhores do Alcoólicos Anônimos (AA) que contaram suas histórias de como conseguiram se libertar do alcoolismo. Compreendi, através dos relatos, que o alcoolismo não significava falta de caráter, fraqueza ou desesperança, mas que eu estava doente. Primeiro eu precisava admitir que era dependente, depois, parar de beber para conseguir me livrar das drogas. Tomei a decisão de, assim que sair do hospital, procurar o AA e conhecer a solução proposta por eles.
Quando participei das reuniões dos grupos de apoio, percebi que, por ser um ambiente em que todos eram dependentes, as experiências compartilhadas conseguiam unir as pessoas. Essa característica possibilitava uma empatia única e um entendimento mútuo dos problemas. Os ouvintes acolhiam quem compartilhava relatos e, juntos, renovavam a consciência da existência de uma doença e a necessidade de permanência no programa de recuperação. Era um processo valioso de doação e troca.
Comecei a enxergar a vida sob diferentes prismas ao participar das reuniões. Frequentemente, via problemas que não expressava, mas que me atormentavam com sentimentos negativos como autopiedade, medo e ansiedade. Tive a chance de conhecer outras perspectivas sobre a dependência de álcool, ampliando minha visão sobre a doença e possibilitando momentos de despertar espiritual. Essa mudança de perspectiva foi vital para a minha recuperação.
Por exemplo, no início da minha busca por ajuda me aconselharam a evitar festas com acesso a álcool, pois eu ainda estava muito frágil para enfrentar esses ambientes. Ignorando essa sugestão, fui a vários churrascos e festas onde todos bebiam. Até recusei as primeiras ofertas de álcool, mas, com o tempo, cedi. Lembro de me sentir muito mal ao perceber que aqueles ambientes não eram mais para mim. Era um tipo de luto que eu não estava preparado para lidar sem o apoio necessário.
Ao voltar dessa recaída, que me ensinou a importância de entender meus limites e ouvir os conselhos dos mais experientes, decidi ter um compromisso com a recuperação. Entendi que, ao parar de beber e usar drogas, estava apenas cuidando da parte física da doença, o programa de recuperação, por sua vez, iria me ajudar com a parte emocional, ou seja, meus sentimentos e gatilhos. Era o início de uma grande mudança que, hoje sei, salvou minha vida.
Desde então, sigo esse programa diariamente. No início, seguia com o intuito de evitar recaídas, depois, continuei a perceber que ele atribuía valor à minha vida. Entendi que não só a doença é progressiva, mas a recuperação também e que isso não precisa ser ruim. Ao auxiliar os outros, me mantenho em crescimento e ainda trabalho a terceira vertente da doença: a esfera social e a dificuldade com os relacionamentos. Sem o programa eu não teria conseguido parar de beber.
A pandemia de Covid-19, em 2020, trouxe uma nova realidade. As barreiras geográficas impostas pelo isolamento social mostraram que a tecnologia pode ser uma aliada poderosa da recuperação. O alcoolismo e a dependência química são doenças com alto grau de recaídas quando enfrentadas sem ajuda. A tecnologia, portanto, pode trazer ferramentas úteis além de uma ajuda especializada e integral no seu celular. Por este motivo criei, ao lado do meu sócio, o aplicativo Padrinho. Um programa de recuperação completo e acessível.
Ao encontrar ajuda, achei também o meu propósito. Eu me tornei uma pessoa disciplinada, resiliente, estudiosa, determinada, altruísta, entre outras qualidades que me orgulho. Descobri que, quando a vida faz sentido, o álcool e as drogas perdem o sentido. Esse é o poder da trilha de recuperação: devolver o sentido da vida.
Se você está passando por situações semelhantes às descritas neste texto, te convido a conhecer nossa trilha de recuperação. Será um prazer te auxiliar no caminho para a sobriedade! Ao guiar você, continuo meu processo de descoberta e desfruto dos despertares que esse programa proporciona. Vamos juntos!