Quando cheguei ao Alcóolicos Anônimos (AA), um grupo de recuperação da dependência de álcool, me sentia em profunda solidão, depressão e desespero. Tive problemas com a substância desde a adolescência e sabia que não tinha o controle: ficava muito bêbada, não conseguia parar de beber e fazia coisas que não me orgulho. 

Pensava que o problema estava no instante em que a euforia do álcool dava lugar a embriaguez total. Tentei de todas as formas me controlar nesse momento, mas a substância sempre ganhava a guerra. Ela me derrotava cada vez mais forte. Até que cheguei ao fundo do poço, depois de 25 anos de uma vida de "alcoolista funcional", em que bebia e realizava todos os meus afazeres. 

Depois de um porre seguido de um apagão em que coloquei minha vida em risco, me senti sozinha, deprimida e com uma ressaca moral imensa. Pensei em desistir, só a morte parecia a solução. 

Foi então que, no desespero total, lembrei do AA e pedi ajuda. Muito envergonhada e achando que minha vida acabava ali, pois não conhecia a vida sem o álcool, pensava não ser possível me divertir, ser feliz ou lidar com os problemas sem ele.

As palavras que ouvi naquele primeiro dia ainda ecoam em mim. O companheiro que me recebeu disse que eu era a pessoa mais importante naquela reunião e pediu que eu continuasse voltando. Que fizesse os sugeridos. Que eu, em breve, conheceria os milagres de AA. Não acreditei muito, porém, não tinha mais muitas escolhas, nada me restava. Então me agarrei nisso.

Me disseram que o problema não era aquele gole entre a euforia e o apagão. Disseram que o primeiro gole era o meu algoz e isso foi a virada de chave na minha cabeça. A cada reunião que eu participava, via os companheiros falando e contando coisas semelhantes as que eu havia feito. Era uma total identificação e por isso continuava voltando. Passei, então, a experimentar linearidade nas minhas emoções e calmaria. 

A ausência das ressacas e das ressacas morais me fazia me sentir cada vez melhor. Até que um dia, depois de uma reunião muito proveitosa, sentei-me em minha varanda, com uma xícara de café e senti uma paz enorme. Meu cérebro havia silenciado. A confusão mental causada pelas besteiras feitas enquanto alcoolizada já não mais existia. Tive, então, meu despertar espiritual. Senti uma imensa gratidão. 

A recuperação não é linear. Dias difíceis ainda existem, mas hoje tenho ferramentas, como as reuniões e orações, para lidar com eles. A vontade de beber ainda aparece vez ou outra e, nessas horas, recorro às reuniões e orações. Me sinto em paz. Cada dia mais grata por tomar a decisão de entrar em recuperação.

A caminhada é longa (toda a vida) mas estou disposta a encará-la. Com fé e com a ajuda de cada um dos companheiros que me fortalecem diariamente. Minha máxima gratidão a Deus, ao AA, ao meu padrinho e a cada um dos que oferecem suas partilhas, suas experiências, vitórias e até derrotas. O apoio é inestimável. 

Só por hoje eu escolho a sobriedade.

Só por hoje escolho me manter grata e em paz!

Sou Luciane, uma alcoolista em recuperação que, há 310 dias, não vai ao primeiro gole e sabe que hoje é o dia mais importante da caminhada!